quarta-feira, 5 de junho de 2013

Suor

Prepare-se para a viagem. 10 Horas.
- Pois não?
- Não, o ônibus não se atrasou.
- Subi contigo.

(...)

- Desço em São Miguel do Oeste.
- (Tchau...)

(...)

- Venderam passagens a mais.

(Não me julgue!)
(Não olhe para mim, não existo aqui!)


Olhe para a janela, o vapor quente penetra na sua pele, no seus ossos.

Eu sento no topo do penhasco... Em posição fetal vejo o granizo caindo à minha direita, a chuva lentamente corroendo a margem do precipício, os raios que parecem mirar em mim mas não me atingem... Por que não me atingem? Por que o vento passa e não me derruba? Por que passa por mim? Passa, passou, passará? Não sei, não faça-me perguntas difíceis, fico confuso. Sana minha confusão! Dá-me uma resposta! Existe uma resposta? O vento trás nuvens, o vento leva nuvens, esconde o sol, exibe a lua, grita em dor... Sonhei que eras professora de Português. Não consigo conjugar. Esqueci-me. Amo, amei, amava, amaria, amarei? Em meu devaneio ensinavas Matemática. Tentava explicar-me a natureza dos números irracionais. Pobres números, incertos, em eterna crise de identidade, mas não podem sair dali, cavam mais fundo em sua cova a cada passo... Um dia desci do penhasco, fui ver como era lá embaixo. Estranho, aqui parece não haver gravidade, tudo flutua, se aglutina e foge ao toque. Será que é para cá que tudo o que morre vem? Acho que fui sugado por um buraco negro. Imagens, sentimentos, dores, vozes, novas, antigas... Caos. Não posso mais controlar meu corpo, minha mente, vou explodir! Não, não posso explodir, meu corpo se desfez há tempos, meu corpo ficou no penhasco, o vento levou meu corpo. Minha mente já não vive, apenas é uma simbiose com o tempo. Tornei-meparte do vento? Eu falo com o vento, mas o vento não escuta, o vento não vê, o vento só sabe ser vento. Será que o vento pode viajar no tempo? Não. Essa é sua sina, trás escuridão, luz, tempestade, mas nunca o tempo. Fica preso à sua natureza cíclica, corroi enquanto tenta reviver a circunstância em que foi criado. Será que o vento pode converter-se ao jainismo?

Rasga, rasga, rasga, rasga. Leve os pedaços. deixe que o mar trague-os.

...

Iemanjá trás de volta?

- Achei minha poltrona, é a número 16.
- Que horas são?

- Já é hora de o vento te fazer cócegas...


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